Contextualizando a ERM

A ERM focaliza como público prioritário as mulheres camponesas vinculadas ao Coletivo Regional de Mulheres – CRM (uma organização territorial das Mulheres da Via Campesina, que se organiza com o apoio do CEAGRO) e a Rede de Agroecologia do Território da Cidadania Cantuquiriguaçu. Prevê o desenvolvimento de ações afirmativas para promover o empoderamento, autonomia econômica e equidade de gênero, com ações de formação nas dimensões político-organizativa e produtiva, considerando que historicamente as mulheres foram e são responsáveis pela maior parte dos alimentos saudáveis e diversificados produzidos para a autossustentação das famílias.

A realidade da região se caracteriza por uma condição de subordinação e subvalorização do trabalho das mulheres, além de altos índices de violência. Embora estas participem de numerosas atividades agrícolas e em dupla ou tripla jornada, sendo fundamentais no processo de produção destinado à soberania e segurança alimentar, a invisibilidade de seu trabalho permanece, mascarando o significado da inserção produtiva dessas, ao estarem, muitas vezes, na condição de “membro não remunerado da família”, expressando assim, a desigualdade de gênero.

Para superar essa realidade, a proposta da ERM nasce da necessidade de consolidar e fortalecer a auto-organização política e produtiva de grupos de mulheres vinculados ao Coletivo Regional de Mulheres – CRM e das mulheres dos grupos de agroecologia vinculados à Rede Cantuquiriguaçu, em áreas de Reforma Agrária e comunidades de pequenos agricultores.

Todas as ações que perpassam a ERM são desenvolvidas de maneira a fortalecer o protagonismo das mulheres e desenvolver cada vez mais a identidade e o método de atuação coletiva e em rede, onde todos os sujeitos se articulam na construção conjunta de um processo de desenvolvimento sustentável que assegure a autonomia econômica e produtiva, o empoderamento das mulheres, a sua efetiva participação e intervenção nos diferentes espaços em que estejam inseridas. Vale ressaltar que o trabalho com as mulheres é um fator de extrema relevância para o desenvolvimento sustentável da região, uma vez que historicamente as mulheres foram menos favorecidas no acesso aos direitos sociais básicos e o trabalho feminino sempre esteve caracterizado como ajuda e não como trabalho produtivo, expondo as mulheres a uma condição de inferioridade que buscamos superar.

 

 

Objetivo da ERM:

  • Consolidar e fortalecer o processo de formação, auto-organização política e produtiva de grupos de mulheres vinculadas ao Coletivo Regional de Mulheres – CRM e à Rede de Agroecologia da Cantuquiriguaçu.

 

Descrição da experiência da Escola Regional de mulheres

 

A proposta da ERM é a tentativa de consolidar um trabalho permanente de formação e organização com as Mulheres da região, na perspectiva de fortalecer e ampliar a organização territorial das mulheres camponesas.

A iniciativa nasceu a partir da definição de algumas estratégias de atuação com as Mulheres, com vistas a construir processos de consolidação de novas relações de gênero, que fazem parte da experiência histórica do trabalho realizado pelo CEAGRO e Movimento Sem Terra, a saber: Formação, Organização, Autossustentação, Agroecologia, Luta, Cooperação, compreendendo-as em sintonia com o processo da construção da Reforma Agrária Popular, ao passo que insere as mulheres como sujeitas ativas na transformação de sua realidade e no seu processo organizacional.

O processo da Escola de mulheres é organizado em Regime de Alternância, com 3 etapas de formação, que envolvem atividades de Tempo Escola e Tempo Comunidade. Já foram formadas 6 turmas: a primeira turma no ano de 2012, a segunda turma em 2013, a terceira turma em 2014, a quarta turma em 2015, a quinta turma em 2016 e a sexta turma no período de 2017-2018.

Sua constituição tem como ponto de partida:

  1. Não ser curso teórico apenas, pois a formação deve se desenvolver em práticas, trocas de saberes entre as participantes e com a comunidade que recebe a turma, deve articular a teoria a prática das vivências das participantes. A formação também ocorre por meio da organização da turma, autogestão, leitura e análise da realidade, organização da ação nos locais direcionadas no tempo comunidade;
  2. Que se constitua com caráter de turma, uma vez que são organizadas 3 etapas de 2 dias cada, com tempo comunidade de aproximadamente 2 meses entre cada etapa, buscando assim um processo de formação que é contínuo. Desta forma cada turma deve escolher seu nome, grito de ordem e simbologias que a identifiquem;
  3. Vivenciar processos organizativos, em que as mulheres possam discutir o método de direção. Envolver as mulheres no método de formação, na divisão dos trabalhos, nas dinâmicas do espaço que recebe a atividade, das áreas de reforma agrária e comunidades camponesas;
  4. Caráter do Tempo Comunidade com tarefas concretas, como a participação em atividades de luta, seminários, encontros, e de organização local, trabalho de base;
  5. A prática formativa é uma mistura de momentos onde são aprofundadas concepções teóricas, políticas e ideológicas, e práticas que estão relacionadas à produção, ou a questões psicológicas, sexuais, afetivas e físicas das mulheres.

 

Outra dimensão importante dessa proposta é a necessidade de articular o acesso à teoria a partir dos problemas que as práticas suscitam (desde os momentos de estudo até as oficinas), de forma que dialoguem com reflexões e debates em torno do papel/função da juventude nos processo históricos de organização da classe trabalhadora.

Os principais temas do programa de formação da Escola de Mulheres são: A participação histórica das mulheres na organização da sociedade; Questão Agrária e História da Luta pela Terra; Método de Trabalho de Base e da Organização Popular; Agroecologia e Cooperação; Gênero e Sexualidade, Violência contra as mulheres; Saúde da Mulher.

A metodologia utilizada se dá por meio de momentos de formação e capacitação teórica, bem como oficinas práticas. Também inclui a organização de intercâmbios para conhecer experiências em que as mulheres estão inseridas no processo produtivo e organizativo. Além dos momentos de estudo na programação, com palestras/seminários, se desenvolve o trabalho com oficinas articuladas e ligadas à prática em diferentes dimensões: expressão corporal e oral; corpo, gênero e sexualidade; produção/Agroecologia.

 

Resultados:

A partir dos 6 turmas organizadas, esta experiência de trabalho de formação e organização com as mulheres conseguiu atingir os seguintes resultados:

  • Maior participação (política e econômica) das mulheres no processo produtivo, cultural e organizativo, contribuindo para o fortalecimento e autonomia das mulheres;
  • Ampliação do conhecimento sobre a produção agrícola e a agroecologia, formando as mulheres que atuam como produtoras e multiplicadoras de informações, técnicas e conhecimento na área;
  • Formação de novas lideranças femininas;
  • Combate à violência contra as mulheres;
  • Consolidação do Coletivo Regional de Mulheres;
  • Consolidação de 10 coletivos de mulheres em áreas de reforma agrária e comunidades de pequenos agricultores;

 

 

Com a palavra as mulheres:

“Eu so meio quieta, no começo não me sentia a vontade pois não conhecia como era. Agora com o apoio das companheiras e na Escola aprendi muito, antes eu nem sabia o que era latifúndio ficava até sem jeito, agora já to falando pras vizinha daquilo que agente aprende e elas precisam ir também. (Deoseli, 2ª turma da ERM, grupo produtivo de mulheres de Porto Barreiro, 2014).

 

“A Escola de Mulheres é um espaço onde as mulheres se sentem realmente mulheres, isto estava perdido entre nós. Não participavam devido a questões de serem casadas, terem filhos, também porque não entendem o que significa o tema gênero. Elas vem com outro pensamento e acabam descobrindo ali o valor e o quanto é importante esse espaço de formação. Os temas condizem o que é a realidade e mostra alternativas para se mudar isso, tanto quanto a liberdade de expressão, a questão da violência. Machismo, agroecologia, temas que envolvem e fazem com que as mulheres debatam isso nas suas comunidades e a mudar seus próprios pensamento e atitudes (Simone, do acampamento Herdeiros da terra de 1° de Maio, 2015).

 

 

POSSIBILIDADE DE REPLICABILIDADE: a experiência pode ser replicada com públicos semelhantes – Mulheres camponesas, de áreas de reforma agrária, comunidades de pequenos agricultores e da agricultura familiar. Com adequações nos temas e na metodologia também pode ser desenvolvida com mulheres de áreas urbanas.

 

Para mais informações:

E-mail: genero@ceagro.org